'Salt print': artista do DF revive técnica artesanal do século XIX para revelar fotografias; confira
03/08/2025
(Foto: Reprodução) Fotografias com técnica salt print.
Rafael Lobo/Divulgação
Desde que surgiu, a fotografia está ligada a ideias como "congelar o tempo", "eternizar um instante", "fazer uma ponte entre passado e presente". As técnicas para isso, no entanto, foram substituídas uma série de vezes desde as primeiras "câmaras escuras" de séculos atrás.
Em tempos de selfies e inteligência artificial, o fotógrafo do Distrito Federal Rafael Lobo, de 46 anos, decidiu resgatar uma técnica fotográfica que, daqui a pouco tempo, vai completar 200 anos: o "salt print", ou impressão com sal.
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📸 Desenvolvido em 1833 pelo inglês Henry Fox Talbot, o "salt print" foi uma das primeiras formas de impressão fotográfica em papel – e a primeira a usar um "negativo" para revelar as imagens.
📸 É um processo manual, artesanal e que gera fotografias quase fantasmagóricas, se comparadas à altíssima fidelidade de cores e formas de qualquer câmera moderno.
Desenhista industrial de formação, Rafael Lobo se dedica à fotografia há mais de 20 anos. Nos últimos anos, passou a usar o "salt print" para retratar imagens de nu artístico – unindo a delicadeza e a experimentação com uma abordagem artística e atemporal.
A história do negativo mais antigo que existe e o 'momento perfeito' que ele registra
William Henry Fox Talbot (à direita), em seu estúdio, que foi o primeiro estabelecimento comercial de impressão de fotografias. Foi fundado com seu ajudante de câmera, o holandês Nicholaas Henneman (1813-1898)
William Henry Fox Talbot
O "salt print" revolucionou a reprodução de imagens no século XIX por possibilitar a reprodução de fotografias através de negativos.
📸 Por ser a primeira técnica desse estilo, as "imperfeições" na revelação se tornam um trunfo. Cada imagem é exclusiva, mesmo se for revelada a partir de um mesmo negativo.
"Comecei a fotografar com filme e logo apareceu a oportunidade da fotografia digital. Com essa tecnologia, as pessoas passaram a fotografar em mais quantidade e com menos preocupação com a qualidade, afinal de contas, não tínhamos um limite de fotos a fazer, como nos filmes", afirmou Rafael ao g1.
Procurei uma técnica que resgatasse as origens da fotografia, o que ia contra a proposta das fotos digitais, instantâneas e em grande volume. Cada Salt print é uma fotografia pensada, única e de valor estético e documental histórico. Isso mudou minha visão na fotografia em uma época em que tudo acontece muito rapidamente. ", conta Rafael
Segundo o artista, a escolha em trabalhar com o nu artístico também resgata um tema recorrente desde os primórdios da fotografia: a exibição do "corpo sendo corpo".
"Não busco por nenhum biotipo em específico, represento todos os tipos de corpos com sua beleza natural e com bom gosto. Faço também ampliações de arquitetura, especialmente de Brasília. O resultado é a apresentação em uma estética antiga de um conteúdo modeno", afirma.
Como funciona❓
A revelação fotográfica pelo método de "salt print" requer materiais específicos – desde a vidraria (bequer, placas de Petri, bastões), passando pelos pincéis e produtos químicos.
A ampliação pode ser feita tanto de fotografias digitais quanto analógicas. Um negativo em acetato cumpre a função de passar a imagem para o papel.
Por envolver muita água, a revelação exige papel-aquarela de alta gramatura.
O "sal" que dá nome à técnica pode ser o citrato de potássio ou o cloreto de amônia. O produto é aplicado no papel.
Em seguida, vem o nitrato de prata aplicado com um pincel – substância que é sensível aos raios ultravioletas (UV).
O negativo é colocado em contato com o papel já tratado com os produtos. Em seguida, o "kit" é exposto à luz UV. O contraste entre as partes protegidas e desprotegidas gera a imagem na tela.
Em seguida, uma solução de tiossulfato de potássio "dessensibiliza" (inativa) o nitrato de prata que ainda não reagiu com a luz. Com isso, a imagem se torna permanente.
Mais do que um simples resgate da técnica, que foi um marco na história da fotografia, Rafael encara o uso do "salt print" como um convite à contemplação e ao cuidado artesanal.
"O 'salt print 'é um processo que depende de vários fatores para acontecer, desde a formulação dos químicos até a variação de elementos como os aditivos que temos na água hoje em dia (cloro, flúor). Cada fotografia feita é uma surpresa, não existe uma certeza de como vai sair. Com o passar dos anos, fui adaptando o procedimento até conseguir o melhor resultado", explica.
Em tempos de imagens instantâneas e digitais, o "salt print" nos lembra da poesia envolvida em cada etapa do processo fotográfico — da preparação ao resultado final.
Veja abaixo algumas imagens feitas por Rafael Lobo usando a técnica:
Torre de Tv de Brasília, em obra confeccionada manualmente utilizando o processo Salt Print.
Rafael Lobo
Impressão com técnica de Salt Print, na foto Rafael Lobo
Rafael Lobo
Arquitetura de Brasília, em impressão com Salt Print
Rafael Lobo
Foto com Salt Print
Rafael Lobo
A obra favorita: tradição e modernidade
O g1 pediu para Rafael Lobo escolher qual das obras, até aqui, é sua favorita.
O artista escolheu uma ampliação que mistura uma composição contemporânea de uma modelo – em posição diferente das representações tradicionais – com a estética de um processo antigo, como se "manchado pelo tempo". Veja:
Obra favorita do artista brasiliense, feita com a técnica do Salt Print
Rafael Lobo
"Essa imagem tem manchas (que podem ser causadas pelos elementos adicionados à água), mas que me rendeu uma imagem expressiva e única", diz Rafael Lobo.
A beleza das imagens e o resgate de uma técnica já em desuso levaram Rafael Lobo a expor os trabalhos fora do Distrito Federal.
Entre os dias 8 e 31 de agosto, as obras poderão ser visitadas na Galeria Via Parque, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro. Rafael também divulga os trabalhos em sua página oficial no Instagram.
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